quarta-feira, 2 de março de 2011
Luz no Escuro
Faltava luz naquela letra, sim talvez um pouco de luminosidade e até suavidade, pensou Jenny. Ela sempre pensava e ficava quietinha, ás vezes decidia falar, mas somente naqueles dias em que nos sentimos hiperativos e com vontade de fazer vontades que nem sabemos que temos. Mas hoje não, hoje é ele que decide, os textos, letras, musicas e os outros manifestos e rebeliões de ideias que só ele deleita sobre as páginas rosadas. Na verdade Jenny nem sabia que espécie de tesouro ela segurava em suas mãos, deitada sobre o sofá preto da sala enrolando uma mecha de seu cabelo ruivo, com o intuito de formar cachinhos que insistentemente não paravam intactos, as pernas cruzadas tortamente, fazendo com que seus pés com meias roxas enroscassem nos cabelos de Steve.
Ah Steve, o pequeno e dengoso Steve. Não eram namorados, eram amigos, se quiser acredite, eu creio nisso, mas é uma crença sucinta, acho que eles têm muito em comum, mas não se completam por medo.
-Tá bom assim, pensei umas coisas aqui com minhas tatuagens, mas acho melhor tu deixar o texto assim, já que é teu. - disse ela, tirando o cigarro da boca dele e já puxando o ar para começar o sermão.
-Nem comece, eu sei, não consigo parar, e você sabe que nem tenho vontade então fique quieta. Não, não quero deixar assim, falta gosto nisso. O teu gosto.
Ela nunca o entendia quando balbuciava a palavra gosto se referindo a ela, nunca tiveram contato íntimo, só toca de lábios e apertos de corpos, só. Mas ela era a única mulher que sentia o cheiro dele dentro d’água e ouvia seu coração, mesmo com o barulho de rock altíssimo, que ele amava, amava mais que tudo, mas mantinha sempre no primeiro lugar dos gostos o nome dela. Aquele sofá preto era bom. Seguro até nos dias de furações e enchentes. Era sempre por entre o tecido daquele sofá e da pele de Steve que ela perdia lágrimas. Perdia lágrimas e suspiros, coloria de preto e branco suas palavras, que se misturavam com as palavras que Steve escrevia, e assim ambos criavam textos e músicas, que nunca foram e nem vão ser impressos, porque nem eles próprios sabem de sua existência.
Jenny adorava tudo nele, todas suas curvas e reclamações, mas o que ela apreciava imensamente, era a sua respiração confusa, acompanhada de sorrisos diversos. Algo que ocorria somente quando ela deitava no sofá e começava a reinar com ele sobre a bagunça que estava o apartamento. Ela arrumava tudo, gostava disso. Já ele não, mas gostava de vê-la arrumando tudo, e tinha um imenso prazer em desajeitar cada milímetro, só para escutar ela suspirar e falar que odiava o apartamento dele, mentira absoluta.
Mentiras que ela dizia desde que se conheceram, ela mentia para se esconder, ao melhor, para esconder a verdade que seus olhos denunciavam. Falava com olhos, sorria com olhos, fazia tudo com olhos, porém só Steve sabia disso e mais ninguém. Assim como só ele sabia, que sua inspiração para o desabar de ideias e rimas, vinha somente quando ela estava presente, quando eles se abraçavam no sofá e ficavam ambos tentando achar desenhos nos olhos um do outro ou quando ela chegava sem maquiagem, com o cabelo desarrumado, meio liso, hora ondulado, e se dirigia aos seus braços, falando o que fulano lhe fizera, o que o coração achava que era o certo, chorando quase sempre por tentar fazer de sua fragilidade, força perante olhos estranhos. A grande frágil mulher. E nessas horas ele sempre pensava: quero essa guria pra sempre pra mim. Sempre quero tê-la em meus braços.
E agora, quando ele escrevia musicas, era ela quem as iluminava. Jenny sabia que ela era a luz, que cada verso, das várias estrofes, eram maneiras ingênuas e petulantes que ele havia achado para soletrar o que o dicionário do coração afirmava constatar-se de amor. Amor ao qual ambos sentiam, não falavam porque não havia necessidade. Jenny era a luz e Steve era a escuridão que nunca escurecia. Um era o ponto fraco do outro. Dependiam-se, tinham que se ter, porque luz sem o escuro não é luz e o escuro sem a luz não pode ser chamado de escuro.
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