Era bom levantar assim, sozinha dessa vez, sem nenhum resquício de barulho pela casa. Somente escutava sua respiração lenta e serena, denunciando que ela ainda tinha um bom tanto de sono preso nos olhos. Era bom escutar isso e estar sozinha como sempre, o ruim era pensar no tudo que tinha que fazer. Porque ela pensava tanto nisso, nos compromissos, na agenda, na hora, nas datas, porque pensava que daqui a pouco iria ser dia tal, e que tudo iria passar de modo que sua ansiedade e seu receio engajado de medos iriam se decompor.
Forçou-se a se descobrir, e a sair com muita reclusa de sua proteção quente e segura.
Ela odiava terque levantar. E como sempre fazia, sentou-se na cama. E olhou seus pés claros e delicados. Pés de bailarina sem balé. Pra ela a dança era algo seu, era uma de suas formas entre tantas. O quarto cheirava a sono com perfume e a dengosidade do ar se impregnava por entre a pele, resultando em preguiça.
Dirigiu-se a cozinha, sempre ia antes ao banheiro para olhar o estado de sua cara, porém a cozinha lhe parecia mais atraente hoje. Esquentou seu café, e se recostou na pia. Correu os olhos por toda a cozinha, que denunciava que passara por uma grande agitação há algumas horas atrás. Eram oito horas da manha e parecia frio.
Abriu a porta, que dava para a varanda de trás da casa e sentou-se no muro baixo que dividia a varanda da calçada. Agora tinha uma xícara de café nas mãos e realmente o frio era apaixonante, arrepiava seu corpo e deixava levemente roxas suas mãos. Não costuma olhar para seu quintal tão cedo do dia, gostava de fazer isso durante a tarde junto ao sol se pondo. Mas sabia que á tarde a casa estaria habitada novamente e sua solidão somente ficaria mais longe.
O casaco rosa claro de sua mãe, que ela havia roubado temporariamente não era o suficiente pra lhe esquentar ali fora. Lembrava do quanto elas brigavam por causa daquele casaco velho, cheio de bolinhas e confortável. Ela o colocava quando levantava, fazia isso só nos dias frios, e quando levantava pensando e não rapidamente louca.
Pousou a xícara bem ao seu lado no muro, e encolheu suas pernas, abraçando-as rente ao peito. Deu um íntimo suspiro e chamou as lembranças, os momentos e pequenos fragmentos de seu feliz sorriso que ela perdeu não sei em que estradas.
A vida agora parecia estar olhando para a direção certa, mas confusa.
Era fácil esquivar-se, era fácil abster-se, era tudo fácil demais. Estava fácil demais, para alguém que agrupou tantos grãos de esperanças, que como a areia, foram grudando-se em outros corpos e só restaram as marcas. Sempre soube, e nunca escondeu de si que tudo seria igualmente igual, semelhante a todas às vezes, cópias cruas e azedas. Porque é sempre igual, são coisas normais, que aceitamos perfeitamente, rotinas. E porque agora teria que ser diferente, não se considera uma hipótese a ideia de que era a parte quebrada que mais se encaixou e deu certo entre várias e várias parecidas.
E bateram na porta. Já de manha, tão cedo e no meio de raciocínios raros. Juntou a xícara com uma trasparecente raiva ríspida. Odiava, Odiava isso. Pra que incomodar os outros desde cedo, não há razão, pessoas educadas não vão acordar quem precisam a qualquer hora do dia, especialmente de manha e com essa batidas incessantes, até julga-se ansiosas. O que resta é abrir a porta, e ver quem foi à pessoa que interrompeu uma manha que parecia ter começado bem...
Continua...
Continua...